quinta-feira, novembro 27, 2008


foto: ed fox

inverso

as casas de meus olhos já não podem dizer se foi a juventude
ou um bálsamo qualquer o meu querer diante da ruína

seu nome de maio
a beleza que a tudo alucina
caindo aos pés da árvore calada da fadiga

num piscar da miragem o semáforo
colorindo as pedras da calçada
cantando a bola da minha chacina

mas que nada
em cores tristes se desenham lágrimas
escorregando dentes frios no fio da navalha
a dor uma eminência parda repetindo a cantilena amada
palavras numa orla de ressaca
andor de pensamentos na arrebentação

nenhum capuz de estrelas ou a lua e seu terço
de tanto adeus se se soubesse o sol chicoteado em sangue
certamente não viria a noite e qual o pecado de um amor ateu

sigo seus olhos à emboscada degrau por degrau
bem de perto para cheirar a beleza que sei que não me vale a mágoa
nem que diante de meus olhos anoitecesse vermelho
certezas só têm os livros fechados que morrem de tédio

nobreza esses seus olhos pintados que não guardam segredos
sobram intenções em seu beijo a tênue semente do acaso
o toque do vermelho em meus lábios vocifera o querer
diante da espera sempre o mesmo cais

deixo de lado o amor
é uma outra rima
a libido dá alma aos lençóis

na noite as pernas arriscando rotas entre umas e outras
mortes vincando o suor

um segundo depois e o desespero de meus erros
me faz crer que despencar do céu na armadilha repleta de encanto
quem me dera me dar ao desprezo de me repetir e rir de tanto espanto

nuvens se passaram por dias
nem sequer uma curva em seus lábios
assistindo página a página o arrefecer de minha alegria
fechando sóis em círculos a sombra de seu corpo em meu caminho

eu que só queria saber do dilúvio tive a chuva diluindo tudo
nem meu barco fora capaz de içar velas e alinhar o prumo
por mais que o vento soprasse palavras a água não tinha vontade
era sempre a mesma chuva fina nas cicatrizes da infância

atrás desse seu corpo vadio cantei canções de memória
enigmas em todas as palavras sussurros de medo
nem mesmo um defunto em quem pôr a culpa do desatino

vento que lambe as cortinas mas não excita
boca que cospe rimas mas não saliva
olho que busca o caminho mas não ensina
ventre que nutre a vida mas assassina
lubricidade que não se dissipa

cria cruel das armadilhas
flor cínica suando azeite de pérola
o que faço desse veneno se ele não me mata
amor velho para dentro da garrafa

4 Comments:

Blogger Lídia said...

Queria eu ter tanto fôlego! Mas caio "aos pés da árvore calada da fadiga" antes...
=)

quinta-feira, novembro 27, 2008  
Anonymous Anônimo said...

E se pergunta: é preciso um persicópio?
Cortando o eco silencioso que boía, de repente surge uma voz sem boca e sem rumo, cega, trôpega...
- Desejo!


;)

Penso que de todas as poesias suas essa é que mais "grudou" em minha alma, principalmente essa passagem abaixo:
"...a dor uma eminência parda repetindo a cantilena amada
palavras numa orla de ressaca
andor de pensamentos na arrebentação

...

amor velho para dentro da garrafa"

Transcendeu minhas vísceras!

quinta-feira, dezembro 04, 2008  
Anonymous Anônimo said...

Esplendoroso! Fascinante! Não consigo parar de deitar os olhos sobre ele, a cada leitura um tipo de emoção se agita em mim!
Taslvez seja por existir uma dualidade, um dilema? Identifico um desejo que não será por muito contido e a consciência do preço que se paga(rá) por aceitar o momento. Existe sim uma evolução crítica que não se detém, apenas avança livremente sem pressa...Ah! alma, alma, pecaminosa...

;)

Seria pretensão minha dizer que algo em vc mudou? Está tudo tão mais leve e sereno sem menosprezar a beleza, a sedução!

quinta-feira, dezembro 04, 2008  
Blogger Otávio said...

show de blog!
poemas rebuscados, mas mto bons..
de resto, q fazer desse veneno se ele não nos mata? boa pergunta..

quinta-feira, janeiro 15, 2009  

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