quarta-feira, dezembro 19, 2007

A pêra do príncipe

O pensamento se faz na boca
Tristan Tzara


Caminho para o céu além no limite do sonho – seja qual for a natureza, estou além de toda e qualquer manifestação de sentido, equivalentemente à saturação do pensamento. Perverto a margem. Sempre pergunto pela única resposta verdadeiramente possível, contudo.

Não me desespero e estou aqui, julgo com mil olhos, enquanto você se vai – tenho verdadeira paixão pela simultaneidade. Vejo sua pequena corrida, estreitando os passos, depois o salto e o pairar instantâneo do seu corpo, a seguir o corte preciso na água; espero que sobrenade, aflito. Então, surge a sua cabeça – a água penteia os seus cabelos; você se vira e sorri. A água que escorre sobre seus olhos contrasta em tantas lágrimas que o seu sorriso desponta um sol no meio da minha cara e me ofusca todos os sentimentos, menos o querer. Nunca farei você sofrer. Com três braçadas você chega à borda da piscina – que pra você é um mar – apoia as mãos e suspende o corpo para, num impulso sobrenatural, se constituir inteira. Você caminha até mim, arrumando o sutiã do biquíni do qual um de seus seios escapuliu, vejo seu mamilo róseo, você olha pra mim e sabe que eu estou olhando, e continua sorrindo; mas não toca na parte de baixo, levemente deslocada e que deixa perceber a curva do seu delta. Sinto uma vontade louca de passear os dedos pela sua barriga. Você se abaixa e me beija, apertando os cabelos com as duas mãos, me molha. E, como se não fosse a sua intenção, me diz:
— Desculpa. Vou entrar, você vai ficar aqui?
Definitivamente, este momento não requereria nenhuma palavra, mas esqueço que você não é inefável, e sempre encontra a palavra para todos os momentos, mesmo os errados, mesmo a palavra errada – só que a transcendência do seu ser torna tudo ao seu redor imperceptível. Meneio a cabeça, com a mão no seu quadril.
— Vou fumar mais um cigarro e terminar a cerveja.
Constato a surpresa nos seus olhos ao ouvir minhas palavras – parece que é a primeira vez que você ouve a minha voz..
— Tá bom, mas não demora, daqui à pouco as pessoas vão começar a chegar.
Você me beija o rosto e escapa por entre os meus dedos. Apanho um cigarro, e faço o movimento de acendê-lo, o mais lento possível, trago e solto a fumaça à luz do sol que já começa a se esconder detrás da serra, não penso nesse momento, saboreio no cigarro a libertação de todos os pensamentos.