quinta-feira, outubro 29, 2009


foto: ed fox

o reflexo do teu sexo
é relha na minha retina

brilham negras essas madeixas ternas
que tu trazes entre as pernas

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segunda-feira, outubro 19, 2009


foto: miguel soza

aniversário

o que quer calar em mim esse frio
esse bater de dentes cerrados que me tira
pouco a pouco de mim o desejo de encontra-me


não viro o vento ao meu favor
sem deus sem perdão sem pecado
quando nada se resolve volto os olhos
ao incólume na breve lucidez desta neurose
aponto com o dedo as estrelas
e busco ouvir o som de um acaso
a luz que me permeia é sombra de um escombro
caminho desolado lado a lado atrás de meu próprio rabo
ainda que de esguelha eu olhe o rabo das meninas
e queira uma só para mim
mas me falta a paciência dos monges tibetanos
que nada dizem e nada fazem
apenas esperam que o tempo aconteça
num despertar do sonho
busco exercitar o ritmo numa síncope que não feneça
que seja apenas serena e tímida e inútil
para quem queria o amor
atravessei todos os mares
e sempre atirei no pé tentando acertar o alvo
de nada me valeram melodias
de nada me valeram poemas
de nada me valeu fazer o sorriso dos outros
enquanto em meu rosto a sombra perene do fracasso
era o único mote válido
de tudo isso não fui capaz ao menos do epitáfio
com o asco dos ratos de rua
e esse odor de baratas mortas
as minhas palavras desordenaram mais do que fizeram mundo
se fiz um mundo ele é inabitável
é frio e árido
não brotam pessoas
não alimento
não tenho nada de semelhante com os brilhantes
nem com os medíocres que causam tolerância
e condescendência
depois de meia existência
só consegui a inocência
de crer que começar tudo outra vez é impossível
porque a história não morre
e a minha essência é esta
um interminável pesadelo
que o sol não iluminará para tornar a estrada bela
eu tinjo o amarelo
e finjo fugir e cair em mim
morrer ou rir sozinho
insano num fosso sem fundo
e o dia de amanhã se tiver de vir que venha
ou que eu termine como o peru de bertrand russell
animala vagula


your face, my thane, is a book where man may read strange matters...

por trás dos seus olhos há sempre um segredo
cuja natureza não faço questão de saber
percebo apenas a noite mal dormida vincada
e um cheiro que certamente não é o meu

seria possível crer em você um anjo (exterminador)
de asas negras num quadro de caravaggio
seus pés se desprendem da terra num salto vago
acorrentados à cripta de um amor sem terceiro dia

eu bem que a queria ensinar música e poesia
dar um jeito na sua alma esculpi-la em carrara
eternamente eu e você sempre na minha (liberdade)
mas infelizmente você gosta de comer chocolates

quarta-feira, outubro 14, 2009

saúde e glória

can wisdom be put in a silver rod?
or love in a golden bowl?


felina de cabeleira lisa e sorriso de lua
cuja nudez extrema arrepia e copula
cada gota de sangue e suor com meus pelos

nefasta em pele de cabra sua lambida
expulsa a fumaça de meus pulmões
para que me permaneça viril a semente e a saliva

salientes suas unhas afiadas de fada
tatuam em minhas costas arqueadas
um rio vermelho em vezos sinuosos

recita em meus ouvidos indecorosa
um rosário de motes e glosas
(que repito inocente aos seus seios)

exausto da lida e da lavra cambaleio
e silencio (não existem palavras)
deixo que a chuva caia (ao sono cedo)
pacto dos lobos

eclesiastes cap. 7, versículo 26

uma mulher não se rouba ou se conquista
tolice pensar que ela lhe pertence
inútil o chumbo das olheiras

noites insones (desgraçada)
ela é o remédio e o veneno
chama insone que consome

(e nunca deixa prisioneiros)

cair em sua trampa é uma questão de tempo (ou dinheiro)
na realidade o caçador é a presa resoluta
nunca soltará as amarras (jamais sairá do atoleiro)




mondschein

opus 27:2

cavalgo a égua da morte sussurro
em seu ouvido toda a sorte de sortilégios
antes morrer de enfisema ou cirrose
a ter de morrer de tédio

(corroboro o que dizes tola
pra minha vida já não há remédio)

não vivo à memória de ontem
joguei o passado na correnteza
varri para trás todas as presenças
desprezando você (o que quer que seja)

fiz de mim um sábio mendigo
a semear a senda dos seus filhos
não restituirei ao carma o suicídio
e sei que sobreviverei ao exílio




atirado do céu em outubro

quando teu corpo se estica
rarefeito em meu cheiro
e sou de novo por inteiro
a língua inefável um tanto mais

quisera fosses meu melhor brinquedo
brilhas na alma o sonho contumaz
tornas um ranger o meu anseio
porque te desejo sem um passo atrás

quem dera fosses sempre pura
e eu te encontrasse em todas as ruas
inda melhor se fosses mais de uma
e não me abandonasses depois das duas

segunda-feira, outubro 05, 2009

linha de passe
ao irmão do fritz que quando gagá só falava de beckenbauer

ensimesmado entre edmund husserl
e martin heidegger (encharco com cachaça)
o meu dasein (intelectual deve jogar bola
melhor entre as coxas de uma loira)

fazendo a existência dos existenciais
(ou pelo menos fazendo meu dia)
nos compassos sincopados o samba aporia
por que é que eu também não fui feliz

(eu quando nasci sabia agora quem saberia)
noite que angustia (são vinicius de moraes
concebei uma fenomenológica mulata logo mais)
quem disse que não há filósofos tropicais




uma página arrancada de kierkegaard


ponho flores no seu túmulo o maior absurdo
desejo de roer seus dedinhos do pé
pela última vez unhinhas em rosa cadelinha
(que se tornarão negras)

sou um idiota por idolatrar cadáveres
(ou será apenas carma este querer inóspito
de provar as entranhas do ódio)

seu fim sereno naquela noite escondia
o desespero de uma rebeldia
(mas mulheres mantém o sigilo
e as aparências nos pecados originais)

você se foi do jeito que veio (não com a inocência mas
sem carro e sem dinheiro na poupança ou investimentos
apenas meu amor desprezado como espólio)

vida linear e óbvia (por que a quis)
a razão de não a poder deixar para trás
é ainda uma incógnita (sem corolário ou escólio)