segunda-feira, janeiro 15, 2007

nós


porque me perdi no meu olho
vermelho esqueci-me de mim nu
paradeiro mudo do teu cheiro
vadio em meu rumo trago o meu

rio um pouco menos sei que
não me verás nunca nem me
dirás onde beberei teu corpo
inteiro não será o meu degredo

se eu mentisse à revelia a saudade
não seria minha conhecida eu te
deitaria com lascívia e revelarias
a mim os teus segredos desmedida
natal de luz


contemplo intacto o último
suspiro indigno do estático
eu nada indago ao tempo
pois ele passa ao largo

de mim aquilo que me resta
quando eu fora magma
é uma estrada deserta para o nada
o zunir de moscas sobre

a minha cabeça sob o sol
e os dedos dos fantasmas
pregando um sorriso estúpido
na minha cara descascada

para onde terão ido as musas
e os fiéis irmãos de farra
a cama em que me deito
férrea me extingue os sonhos

o suor torra meus miolos e me amarra

quero a tempestade
e a destruição desta cidade
com seus monumentos e parques
quero derrubar todas as árvores
e arrancar as pedras de petit-pavê
em que os saltos altos
gravaram os rumores das damas
da alta sociedade

escapo pelo avesso
o que me libertará será a forca do
infinito no horizonte

corro em direção a todos olhos
para que as flechas me rasguem as tripas
mas a crueldade dos arqueiros
não lhes permite vítimas

meu sangue será uma vinha e na vindima
embriagarei as menininhas
em seu teatro mágico de todos os dias
protegidas por automóveis
e festas nas casas de família
a eliminação da metafísica

algo surpreendente acontece com as mulheres aos 27 anos – com uma ligeira diferença para mais ou para menos – elas pura e simplesmente enlouquecem, entram em estado vulcânico, azar o seu se estiver por perto.
é sintomático: elas mudam o corte de cabelo – talvez até a cor –, começam a comprar os cosméticos anti-rugas tops de linha, se vestem de maneira diferente, passam a freqüentar o “café” da moda – onde os garçons usam aventais verdes e são jovens e atléticos – se fumam, deixam de fumar, e se não fumam passam a fumar (quase sempre carlton creme).
a princípio você vai achar isso ótimo, ela está a cada dia mais bonita, só que curiosamente passou a não trocar de roupa na sua frente e arranjou um “amigo” na internet – quase sempre um estrangeiro exótico: búlgaro, hindu ou grego – além de reencontrar “por acaso” aquele ex-colega de faculdade bem sucedido que mora no rio de janeiro.
e então “zás!” você perdeu.
de uma hora pra outra você irá materializar todas as frustrações dela e representar aquilo de melhor que ela não conseguiu conquistar e o de pior que ela conquistou: rugas e pelo menos dez quilos a mais. daí o “amigo” da internet e o ex-colega de faculdade bem sucedido serão os caras mais interessantes do mundo – os “caras legais” que a ouvem e a fazem sentir-se inteligente, e você passa a ser um tirano que exigiu dela a renúncia a tudo o que ela gostava em troca de um sexo de segunda. “você se acha bom nisso?”. “quem disse que você sabe chupar boceta?”. “seu pau é pequeno”. “a sua inteligência é mera erudição livresca”.
e o que fazer? a coisa mais terrível que pode ser dita por uma mulher não é que ela gosta de você como amigo (essa é a segunda coisa), é: “me deixe amar quem eu quiser”. anos de juras de amor serão atirados à primeira brisa, tudo justificado pela “mudança”, como se esse estado feminino a mantivesse isenta de qualquer responsabilidade com você. e o terrível é que todo mundo será compreensivo com ela e jamais com você. você é um sujeito incapaz de diálogo – mas quem disse que ela quer conversar? você a sufoca. aos poucos os seus amigos se tornaram os amigos dela, você passa a ser convidado (quando é convidado) através dela para todos os eventos e lentamente vai parecer que as idéias brilhantes que você teve não eram suas, mas meros lampejos que a convivência com uma mulher genial lhe permitiram. você vai sentir a saudável e natural vontade de matá-la, concomitantemente com a vontade de se suicidar. se agir será culpado, se não agir será omisso.
depois, tudo isso vai passar e ela voltará a ser exatamente aquilo que era, só que com a diferença de que não será você quem estará ao seu lado, e sim um dos sujeitos que “não tem defeitos” – os “caras legais”. e, enquanto você percebe que todas as canções de dor de cotovelo do mundo fazem sentido, secando barris de álcool, ela ficará mais e mais linda e tratará você com todo o sensual carinho do qual você nunca cogitou que ela fosse capaz, e o pior: vai querer que você “não seja careta” , sendo seu confidente e melhor amigo. não há saída, o gato pegou o rato.